Obras Suntuosas sem Retorno ao Consumidor

Nunca fui contra a melhora de qualquer empreendimento que tenha benefícios direto ao consumidor final. Refiro-me, particularmente, aos planos de saúde coletivos por adesão, que estão prestes a reajustar suas mensalidades, segundo propala a imprensa, de um modo arbitrário e astronômico, sem ao menos auscultar seus consumidores e parcela do órgão governamental fiscalizador. Isso é decorrente do afã de lucros, notadamente quando se divulga de que não há para esse tipo contratual, qualquer impedimento de cunho jurídico.

É verdade que a Lei os protege de maiores rigores legais.

Valendo-me dos ensinamentos dos irmãos especializados na área, “ a verdade é que, embora a decisão do tema 952 pareça irretocável, a Segunda Seção do STJ pecou ao limitá-la unicamente aos planos individuais/familiares. Não havia qualquer justificação jurídica para essa limitação, uma vez que, em se tratando de reajustes etários, – acrescento eu – qualquer tipo de reajuste –, pois as bases técnicas e jurídicas são rigorosamente as mesmas para os planos individuais/familiares e para os planos coletivos. Em função disso, esses mesmo reajustes, no âmbito dos contratos coletivos, continuaram sendo questionados e muitas vezes invalidados judicialmente”. (Planos de Saúde e Superior Tribunal de Justiça. Augusto e Bernardo Franke Dahinte. Editora Roncarati, 2021, página 339).

Em uma recente crônica nesse sítio, sob o título Recursos Repetitivos e Planos de Saúde, afetos à segunda Seção, no Tema 1.016, salientei o que se decidiu na letra b daquele julgado, vale dizer, “o sentido matemático da expressão “variação acumulada”, referente ao aumento real do preço verificado em cada intervalo, deve-se aplicar, para sua apuração, a respectiva fórmula matemática, estando incorreta a simples soma aritmética de percentuais de reajustes, ou o cálculo de média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias”. (Sábado, 02 de abril de 2022).

Acho que esse atual entendimento do STJ, satisfaz melhor os interesses dos usuários desses planos de saúde.

O que existe de paralelo até aqui, com obras suntuosas sem retorno ao consumidor aposto no título dessa crônica?

Muito, muito, estimadas leitoras e distintos leitores!

Querem que exemplifique materialmente?

Circula na mídia que a Qualicorp inaugura espaço de co-working e relacionamento em São Paulo.

A “chamada” dá conta de que um prédio histórico naquela Capital foi totalmente reformado. Até aí, sinal de progresso e de empreendedorismo, sinônimo de lucro e conforto para seus colaboradores.

O que me insurjo, data vênia, sem nenhum falso moralismo é de que a reportagem aduz que a obra foi “planejada como espeço multiuso, com infraestrutura de última geração, a Qualicity contempla atividades de trabalho colaborativo, tais como reuniões, treinamentos, produção de conteúdo e uma consistente programação de eventos com seus pares. Aí, no ponto, reside a indignação: “a cidade da Quali oferecerá serviços como cozinha-gourmet, barbearia, salão de beleza, entre outros”.

Não seria melhor que essas empresas administradoras de planos de saúde junto com as entidades de planos de saúde, cuidassem de administrar melhor o atendimento de seus consumidores e respectivos usuários?

Jamais fui anticapitalista. Nem os antigos países de ferro, assim como seus dirigentes, com eram denominados outrora, fugiram daquilo que a natureza produz e produziu no mundo capitalista. Pensar, de modo diverso, é pura demagogia e do mais lídimo onirismo, dedicados leitores.

Regalias criadas escurecem e empanam a expansão de direitos que devem ser consequências de causas mais nobres e justas.

Em nome de uma pretensa igualdade se criam desigualdades que deveriam ser utilizadas para maior conforto dos seus utentes.

Neste pensar, de outra banda, não se pode coadunar com fatos empíricos de que cálculos atuariais projetados não satisfaçam a necessidade de incipientes modelos de tratamento para novas doenças que surgem com o evolver dos tempos.

O que se dirá, então, para aqueles que pagam religiosamente seus compromissos numa verdadeira bilateralidade do negócio jurídico – contratos cativos, na feliz expressão de Cláudia Lima Marques, e, que, mesmo assim, são sumariamente alijados da contraprestação, atribuídos a fatos que essas empresas se julgam detentoras, a meu ver, de uma cláusula puramente potestativa, defesa em lei, mas acobertas pelos entendimentos dessas associações?

É deplorável para não dizer abjeto.

Urgem reformas estruturantes como tenho dito, quase que religiosamente por meio desse informativo, que tenho a honra de receber o apoio de muitos leitores.

O exemplo deve partir de cima.

Porém, contamos sempre com princípios de equidade e da ética, perdurando ao longo dos séculos e ultrapassando inúmeras gerações, consolidando ao final aquilo que é justo, correto e certo.

O que expus acima faz, com respeito a opiniões divergentes, todo o sentido, minhas amigas e amigos!

Porto Alegre, 11 de abril de 2022

Voltaire Marensi
Advogado e Professor