A Pandemia e os Planos de Saúde
Voltaire Marensi
Advogado e Professor
Volto ao tema convidando a atenção de nossos estimados leitores e leitoras sobre um tema recorrente, vale dizer, a pandemia e os planos de saúde.
Pois bem. O Supremo Tribunal Federal, em decisão de seu plenário virtual, por maioria de votos, julgou inconstitucional através de uma ação Direta de Inconstitucionalidade movida pela Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização – CNSEG – o nome é grande e o poder econômico também, com a devida vênia à Instituição.
Uma Lei Estadual fluminense, sob número 8.811/2020 impedia as operadoras de planos de saúde, de suspender, cancelar ou cobrar multas por falta de pagamento durante a pandemia.
Destarte, nos termos da condutora do voto vencedor, ministra Carmen Lúcia, a Corte considerou que a matéria é de competência privativa da União. E, de fato, o é.
Ao abril a divergência o ministro Marco Aurélio votou pela improcedência do pedido ressaltando que a lei “buscou potencializar mecanismos de tutela da dignidade dos consumidores, considerada a pandemia da Covid-19, a implicar crise econômica e financeira”. O que a meu juízo, por paradoxal que pareça diante do que disse acima, também corresponde com a verdade, verdadeira como disse outrora nosso estimado vate Carlos Drummond de Andrade.
No caso concreto, a lei hostilizada objetivou a proteção do consumidor em situação de vulnerabilidade disciplinado por normas de direito civil de competência privativa da União.
Também é correta, venia concessa, a assertiva que se cuida de uma interferência, via lei estatal, na vigência de contratos de trato sucessivo como sói ser os planos de saúde.
Porém, não menos verdadeiro é o fato de que o nosso Poder legiferante deveria se preocupar mais com assuntos relacionados à saúde propriamente dita, bem como a financeira de nossos consumidores, ao revés de procurar culpados na instalação da CPI da Covid no Senado da República.
Ressaltei, em minha última crônica lançada neste prestigiado site, que o respeito à dignidade é um dos princípios insertos no direito de personalidade protegido por lei federal, vale dizer, o que está posto no artigo 11 do nosso Código Civil, assim vasado:
“Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
O artigo seguinte impede a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade podendo o prejudicado reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
O que disse em artigo a ser publicado em obra coletiva em homenagem aos 20 anos do IBDS –, sob a batuta dinâmica e proficiente de seu Presidente Ernesto Tzirulnik -, reproduzo aqui:
“O sobredito projeto dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus (Covid -19).
Data vênia, dos ilustrados participantes deste projeto de lei, – após complicada tramitação no Congresso Nacional, foi promulgada a Lei nº 14.010/2020-, ouso afirmar, disse eu ao azo, a parcimônia de regras que ali se encontram previstas. A uma, porque cuida-se de um projeto pontual que não abarca várias matérias insertas no campo do Direito Privado. A duas, o projeto cuida só de temas específicos, sem se preocupar “com o todo”, aliás, tarefa hercúlea nos dias atuais. A três, embora o artigo 8º preveja “Relações de Consumo” este Capítulo cuida da suspensão da aplicação de um único dispositivo legal desse Código, vale dizer, o artigo 49 (hipótese de produto ou serviço adquirido por entrega domiciliar – delivery”.
O abuso e o reajuste de todos os nossos planos de saúde são escandalizantes, malgrado não se tenha um diploma atual que coíba todo e qualquer abuso praticado em detrimento do respectivo usuário.
Os reajustes são praticados sob os mais diversos rótulos, e os lucros exorbitantes não param de enriquecer os seus digníssimos dirigentes.
Não há aqui qualquer mensagem desabonadora ao lucro que deve reger qualquer atividade comercial. Mas, com todo o respeito, dentro de um critério de lo reasonable como dizia o filósofo e Professor Catedrático na Universidade de Madrid Luis Recaséns Siches na sua obra, Lógica do Razoável.
É o que penso, malgrado opiniões e conceitos divergentes aqui lançados.
O próprio Governo Federal através de seu órgão fiscalizador deveria repensar e analisar melhor à espécie adequando fatos à realidade.
Enfim, para não cansar demasiadamente nossos estimados leitores e leitoras, deixo à meditação de todos para que, em um futuro recente, se possa tirar conclusões de como o decantado consumidor é tratado em nosso país.
Porto Alegre, 20/05/2021