O outro, o segundo sexo

L’autre, le deuxième sexe.

Por Gisele Leite

Professora universitária há três décadas; Mestre em Direito; Mestre em Filosofia; Doutora em Direito; Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas; Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE – Associação Brasileira de Direito Educacional; Vinte e nove obras jurídicas publicadas; Articulistas dos sites JURID, Lex Magister; Portal Investidura, Letras Jurídicas; Membro do ABDPC – Associação Brasileira do Direito Processual Civil; Pedagoga; Conselheira da Revista de Direito Civil e Processual, Revista de Direito Prática Previdenciária e Revista de Direito Trabalho e Processo, da Paixão Editores – POA – RS.REFOME

 

Resumo: A frase mais impactante de Simone de Beauvoir foi: “Ninguém é mais arrogante em relação às mulheres, mais agressivo ou desdenhoso do que o homem que duvida de sua virilidade” outra frase que bem definiu a mulher foi: “Não se nasce mulher: chega-se a sê-lo”. A construção do ser feminino é complexa e poliédrica, e ainda, em pleno século XXI nos deparamos com elevados índices de feminicídio, violência doméstica e assédios morais e sexuais. Ao final do texto que tem cunho didático, há um pequeno rol de conquistas das mulheres, mas ainda há muito mais a ser conquistado que é o reconhecimento da dignidade humana da mulher em todos os campos.

Palavras-chave: Filosofia. Feminismo. Beauvoir. Existencialismo. Mulher. Direitos da mulher.

 

Résumé: La phrase la plus percutante de Simone de Beauvoir était: « Nul n’est plus arrogant envers les femmes, plus agressif ou dédaigneux que l’homme qui doute de sa virilité ». Une autre phrase qui définissait bien la femme était: « On ne naît pas femme: on le devient. “. La construction de l’être féminin est complexe et polyédrique, et pourtant, au XXIe siècle, nous sommes confrontés à des taux élevés de féminicide, de violence domestique et de harcèlement moral et sexuel. À la fin du texte, qui a un caractère didactique, on trouve une petite liste de réalisations des femmes, mais il reste encore beaucoup à faire, à savoir la reconnaissance de la dignité humaine des femmes dans tous les domaines.

Mots-clés: Philosophie. Féminisme. Beauvoir. Existentialisme. Femme. Les droits des femmes.

 

A abordagem de Simone de Beauvoir em sua obra “O Segundo Sexo”[1] é baseada numa crítica atenta contra a predominante visão machista que enxerga a mulher como o “outro”, mas em sentido negativo em relação ao masculino.

Não sendo reconhecida uma alteridade positiva, descrevendo características peculiares e independentes das imposições masculinas. Então a alteridade descrita pela filósofa é voltada para o sujeito feminino, encarada como em segundo plano, para a qual, infelizmente, não se reconhece reciprocidade.

A obra em referência fora publicada em 1949 e demonstra que a alteridade é categoria fundamental do pensamento humano. E, reconhece que nenhuma coletividade se define como Uma sem colocar imediatamente a Outra diante de si. Ao longo da história das sociedades humanas encontramos a constante dualidade que pressupõe a relação eu/outro.

E, até citou Lévi-Strauss quando apontou a passagem do estado natural para o estado cultural, identificando a dualidade, o reconhecimento do Outro, como um estranho, um diferente, o que acontece para ambos os sujeitos na relação.

A alteridade como categoria do pensamento carrega, implicitamente, a possibilidade da reciprocidade. Ao questionarmos a reciprocidade entre os sexos, percebe-se que quando se refere ao sexo feminino, tal reciprocidade é negada e, o outro, não é definido como uma alteridade positiva.

A filósofa questionou[2] o motivo de as mulheres não se revoltarem contra a negação de reciprocidade e nem reagirem quanto à imposição de uma alteridade negativa. A incontestável soberania do macho ainda perdura em pleno século XXI.

Apesar de que muitos direitos das mulheres foram conquistados e duramente impostos, embora tenhamos inflacionados os índices de feminicídio, de assédios morais e sexuais na sociedade contemporânea.

De fato, a desigualdade pode ser encarada pelo fator numérico ou ainda estatístico, onde normalmente a maioria se impõe contra a minoria, mas a filósofa nos aponta que existe um número tão expressivo de mulheres quanto o de homens no mundo.

Em verdade, há mais mulheres, portanto, são a maioria em grande parte do mundo, é o caso de nosso país, e apesar disso ainda restam submetidos aos interesses e autonomia do gênero masculino.

O ritual de passagem do estado natural para o estado cultural se define pela aptidão humana em pensar nas relações biológicas[3] sob o prisma de sistemas de oposições, por exemplo, a dualidade, a alternância, a oposição, a simetria que são definidas, ou coo força vagas que constituem menores fenômenos a serem explicados que os dados fundamentais e imediatos contidos na realidade social.

A subordinação feminina é evento histórico que não se deve somente à fisiologia das mulheres, mas devido ao processo histórico identificamos que, quando surgiram as primeiras sociedades organizadas com base na agricultura, a submissão feminina se destacou, acompanhando   o   desenvolvimento   de hierarquias de poder nessas primeiras sociedades sedentárias.

Tal situação é perpetuada no decorrer da história e impregna as culturas das sociedades humanas ditas civilizadas, do Ocidente ao Oriente, mesmo em épocas nas quais a força física pode ser substituída pela praticidade de novas tecnologias.

O sexo masculino é ainda visto como sendo referência para se definir o que a espécie humana deve ser, enquanto que a mulher é ainda classificada como alteridade negativa, diante da figura masculina. Obviamente, porque a história foi moldada pelos próprios homens.

Até hoje predominam os estereótipos culturais que transformaram mulheres em sujeitos reprimidos, submissos ou apagados, condicionando-as para tarefas que os homens não se sujeitam ou evitam realizar, tais como cuidados com o lar, os filhos, cozinhar, limpar e, manter tudo em ordem. Aliás, o estereótipo da “esposa ideal” foi imposto por uma cultura dominada pelo sexo masculino.

Logo na introdução de sua obra, a filósofa citou a relação entre senhor e escravo para elucidar a situação das mulheres. E, por meio da dialética de Hegel definimos a relação do senhor com o escravo se aplicariam também com relação do homem com a mulher.

A união de senhor e escravo se dá pela necessidade, o escravo não questiona e se submete, passando a servir seu amo e senhor até o fim de sua vida. Mas, o senhor, ao revés, não se faz notar a necessidade do escravo enquanto força de trabalho.

Afirmou  Beauvoir  que  a  mulher sempre foi como uma “escrava do homem”, ela nunca compartilhou um mundo em igualdade de  condições, sempre  foi  sua  vassala.  No  entanto, mesmo  entre  os  escravos,  as  mulheres escravas  são  subjugadas  aos  homens  escravos, e  aí  está  a  identificação  de  algo  importante para analisarmos e  tentarmos compreender, no  que  diz  respeito  ao  problema  da  subjugação feminina,  pois demonstra  que  o  machismo se  faz  notar  mesmo  entre  os  que  são  explorados por  outros  grupos  humanos.

Uma situação  semelhante  encontramos  dentro  da  classe  trabalhadora (maioria da população em quase todos os países do mundo e, em especial, nas sociedades em que o capitalismo é o modo de produção vigente, submetida aos interesses da classe burguesa e  seus  agentes  políticos),  o  machismo  aparece  muitas  vezes mesmo  em  movimentos  que pretendem promover a libertação proletária.

Somente no momento em que as mulheres começarem a tomar parte na elaboração do mundo, mundo que ainda pertence aos homens. Todos bem o sabem, porém, elas mal duvidam.

Beauvoir apontou a desigualdade extrema de condições entre homens e mulheres, citou exemplos em que os homens possuem salários mais altos, possuindo mais altos maiores possibilidades de êxito em relação às suas concorrentes; eles ocupam na política os cargos mais importantes em grande número; na indústria, um maior número de lugares e sempre os postos mais importantes.

O presente  envolve o passado, e no passado toda  a  história foi feita pelos homens, pois, afinal, foi,  até  hoje,  predominantemente  contada  por  eles.  Essa  situação  afeta  até  mesmo a  forma como as mulheres encaram a si mesmas e outras mulheres.

Enfim, a mulher se prende ao homem sem reclamar reciprocidade e nem consegue autoafirmar-se como sujeito autônomo e resta presa às amarras primárias para sua sobrevivência.

Enquanto o homem se encarrega de garantir os recursos materiais para a sobrevivência da mulher, automaticamente a mulher se une a ele mais fortemente, passando a buscar sentido para sua existência justamente na ligação e dependência ao homem; por isso sua transcendência é prejudicada, e sua vontade é submetida à vontade alheia.

No  decorrer  de “O  segundo  sexo” buscará  respostas  para  compreender  os motivos  que  levaram  a  mulher à categoria de “Outro” em um sentido negativo. O problema geral, ressalta ela, está em torno dos seguintes temas: como a “realidade feminina foi constituída”; por quais razões a mulher foi definida como o “Outro”; quais foram as consequências do ponto de vista masculino.

A filósofa justifica que não poderemos encontrar as respostas para essas questões se considerarmos apenas os fatores econômicos como motivos principais para a submissão feminina.

Para Beauvoir, precisamos entender a mulher como um “Existente no mundo”; ela (a mulher), também, quer buscar os seus valores e fazer parte do mundo, ativamente.

A mulher enquanto indivíduo existente possui uma liberdade e descobre-se em um mundo onde homens lhe impõem uma condição de “Outro em subjugação”, um outro para o qual não se reconhece reciprocidade ou alteridade positiva; ela torna-se objeto sem imanência, e sua transcendência é ultrapassada por uma outra consciência soberana: “o homem”, o “Sujeito absoluto.

A filósofa defendeu o projeto existencialista[4] para qualquer sujeito, onde todos possam construir a si mesmos de forma autônoma, mas na interação com o mundo e levando em consideração a imersão humana em sociedade.

Afinal, todo sujeito se coloca concretamente através de projetos como transcendência, e somente galga sua liberdade através de constante superação em razão de outras liberdades, não há outra justificação da existência presente senão sua expansão para um futuro indefinidamente aberto (BEAUVOIR, 1970, p. 22-23).

Para a filósofa esse é um referencial ético que deve ser levado a sério.  Todo  indivíduo  que  se  preocupa  em  justificar  sua  existência  se  sente impulsionado  por  uma  necessidade  indefinida  de  se  transcender.

Para tal projeto poder ser realizado, obviamente é necessário encontrar propícias condições na vida em sociedade e, nesse ponto, infelizmente, ainda notamos na maioria das sociedades contemporâneas a presença forte do machismo (em algumas sociedades mais violento e mortal do que em outras), prejudicando a efetivação dos projetos existenciais das mulheres.

Ora, o que define de maneira singular a situação da mulher é que, sendo, como todo ser humano, uma liberdade autônoma, descobre-se e escolhe-se num mundo em que os homens lhe impõem a condição do Outro.

Pretende-se torná-la objeto, votá-la à imanência, porquanto sua transcendência será perpetuamente transcendida por outra consciência essencial e soberana.

O drama da mulher é esse conflito entre a reivindicação fundamental de todo sujeito que se põe sempre como o essencial e as exigências de uma situação que a constitui como inessencial. (BEAUVOIR, 1970, p. 23).

Reconhece-se que algumas mulheres que não eram associadas à família e à herança obtinham uma considerável liberdade, entre estas estão as prostitutas gregas. E, que tinham respeito, e podiam se expressarem de forma mais livre que as demais mulheres, porém, tal situação se apresenta de modo ambivalente, pois que escapam da tutela masculina, podendo ser apresentada como similar e quase igual ao homem.

A filósofa argumentou que tal representatividade que o casamento[5] possui fora construída para beneficiar os tutores e, ainda, se apresentar como centro de interesses entre os homens, em face justamente da herança e da propriedade privada.

Registram-se mudanças no Estado Romano e sua política republicana, na qual a mulher obteve direito sobe seus filhos e possui considerável autonomia com relação ao seu casamento e suas posses.

No feudalismo, a mulher continuou a usufruir de pouca autonomia, principalmente como relação aos bens, sendo protegida pelas leis, mas somente na condição de esposa e de mãe. Ao final da Idade medieval, o destino da mulher se fez incerto devido à desvalorização do feudo e com a ascensão.

A situação da mulher se modificou entre os séculos XV ao XIX, mas principalmente nas classes privilegiadas.  Nos séculos XV e XVI a instrução das mulheres ainda é baixa, mas há a preocupação com a educação destas por parte de seu meio familiar, no século XVII elas passam a se distinguir e ganhar espaço no meio e na arte. [

Devido a isto, elas passam a imergir aos poucos no universo masculino, apesar de ainda sofrerem   repúdio dos homens. No século XVIII, a independência da mulher aumenta mais ainda, apesar da imposição pelo casamento, a burguesia concede às mulheres maiores licenças para atuar no mundo.

Na Idade Média, ergue-se a imagem mais acabada da mulher propícia aos homens: a figura da Virgem Maria cerca-se de glória.

É a imagem invertida de Eva, e pecadora; esmaga a serpente sob pé; é a mediadora da salvação como Eva o foi da danação. É como mãe que a mulher é temível; é na maternidade que é preciso transfigurá-la e escravizá-la, a virgindade de Maria tem principalmente um valor negativo: não é carnal aquela por quem a carne foi resgatada; não foi tocada e nem possuída, Maria não conheceu a mácula que a sexualidade implica.

Pela primeira vez na história da humanidade a mãe se ajoelha diante do filho e reconhece livremente a própria inferioridade: é a suprema vitória masculina que se consuma no culto de Maria, é a reabilitação da mulher pela realização da sua derrota.

A evolução da condição feminina prosseguiu desde o Estado Romano e sob a influência do cristianismo e, tais mudanças foram repercutindo na situação da mulher.

Registre-se que com o cristianismo, através da Igreja Católica no casamento e sobre os filhos. Os povos considerados bárbaros concediam direitos à mulher, não obstante a fraqueza física da mulher, que não correspondia a uma inferioridade moral ou social.

A originalidade do catolicismo de Claudel está num otimismo tão obstinado que o próprio mal retorna ao bem.  Claudel adere a toda criação; sem o inferno e o pecado, não haveria nem liberdade e nem salvação.

Quando fez surgir este mundo do nada, Deus premeditou a queda e a redenção, aos olhos dos judeus e dos cristãos, a desobediência de Eva colocara as mulheres em má situação: sabe‐se quanto os padres da Igreja desprezaram a mulher.

Finalmente, a filósofa concluiu afirmando que atualmente é muito difícil às mulheres assumirem concomitantemente sua condição de indivíduo autônomo e seu destino feminino, e sem dúvida, é mais confortável suportar uma escravidão cega que trabalhar para se libertar: os mortos também estão mais bem adaptados à terra do que os vivos.

Então, o que se deve esperar é que os homens assumam sem reserva a situação que se vem criando, somente então a mulher poderá viver sem tragédia.

Assim ela será plenamente um ser humano “quando se quebrar a escravidão infinita da mulher, quando ela viver por ela e para ela, o homem‐ até hoje abominável – tendo lhe dado a alforria

Conclui-se que a despeito de lendas, nenhum fisiológico impõe ao macho e à fêmea, como tais, uma eterna hostilidade. Na humanidade, ocorre diferente, trata-se de um devir histórico e se define pela maneira pela qual assume a facticidade natural.

A escravização das mulheres pelos homens e a desvalorização da feminilidade foi fase necessária à evolução humana e pode engendrar colaboração entre os dois sexos.

Inegavelmente que o século XX apresentou grande progresso em referência aos direitos das mulheres. Aliás, a Constituição brasileira de 1934, pela primeira vez, promoveu a igualdade entre os sexos.

Não obstante a popularização dos debates a respeito da igualdade de gêneros, do feminismo, do combate a machismo é trivial deparar-se com as desigualdades salariais, violência sexual, violência doméstica, feminicídio e baixa representatividade na política e no Judiciário.

Ainda segundo o IBGE, em 2016, 21,5% das mulheres de 25 a 44 anos concluíram o ensino superior. Já em relação aos homens, apenas 15,6% concluíram uma graduação. Todavia, mesmo com maior escolaridade, o salário médio das mulheres era cerca de 23,5% menor que o dos homens.

O grande desafio da mulher no século XXI, é saber fazer escolhas conscientes, que respeitem sua essência e seus limites, ou seja, escolhas que a façam estar mais inteira e plena, na vida e nas suas relações.

Observação: Eis pequeno rol de conquistas das mulheres:

1827 – Meninas são liberadas para frequentarem a escola;

1832 – A obra “Direitos das Mulheres e Injustiças dos Homens” é publicada. A autora Nísia Floresta desafiou as tradições e costumes da sociedade ao publicar seu livro Direitos das Mulheres e Injustiças dos Homens. Ela foi a primeira mulher brasileira a denunciar em uma publicação o mito da superioridade do homem e de defender as mulheres como pessoas inteligentes e merecedoras de respeito igualitário.

1879 – Mulheres conquistam o direito ao acesso às faculdades;

1910 – O primeiro partido político feminino é criado. Mesmo que a Proclamação da República no Brasil tenha ocorrido em 1889, foi apenas vinte anos depois, em 1910, que nasceu o Partido Republicano Feminino, como ferramenta de defesa do direito ao voto e emancipação das mulheres na sociedade.

1932 – Mulheres conquistam o direito ao voto;

1962 – É criado o Estatuto da Mulher Casada; A Lei nº 4.212/1962 permitiu que mulheres casadas não precisassem mais da autorização do marido para trabalhar. A partir de então, elas também passariam a ter direito à herança e a chance de pedir a guarda dos filhos em casos de separação. No mesmo ano, a pílula anticoncepcional chegou ao Brasil.

1974 – Mulheres conquistam o direito de portarem um cartão de crédito;

1977 – A Lei do Divórcio é aprovada; somente a partir da Lei nº 6.515/1977 é que o divórcio se tornou uma opção legal no Brasil. Porém, é importante ressaltar que anos após a validação da lei, as mulheres divorciadas permaneciam vistas com maus olhos pela sociedade.

1979 – Mulheres garantem o direito à prática do futebol;

1985 – É criada a primeira Delegacia da Mulher;

1988 – A Constituição Brasileira passa a reconhecer as mulheres como iguais aos homens;

2002 – “Falta da virgindade” deixa de ser motivo para anular o casamento;

2006 – É sancionada a Lei Maria da Penha; A Lei nº 11.340/2006 foi sancionada para combater a violência contra a mulher.

2015 – É aprovada a Lei do Feminicídio; A Constituição Federal vigente reconheceu a partir da Lei nº 13.104/2015 o feminicídio como um crime de homicídio qualificado.

2018 – A importunação sexual feminina passou a ser considerada crime; A ocorrência deste tipo de prática contra as mulheres é tanta que a pauta feminista precisou incluir em suas ações a defesa da lei que caracteriza o assédio como crime (Lei nº 13.718/2018)

2021 – É criada lei para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher; A Lei 14.192/21 estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher ao longo das eleições e durante o exercício de direitos políticos e de funções públicas. É violência política contra as mulheres toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos.

2024 – A França se tornou o primeiro país do mundo a incluir o direito da mulher ao aborto[6] na Constituição. A decisão ocorreu na segunda (4/3/2024) durante uma sessão especial no Palácio de Versalhes, convocada pelo presidente Emmanuel Macron, com os parlamentares das Câmaras alta e baixa.

O aborto na França é legal mediante solicitação até quatorze semanas após a concepção (dezesseis semanas após a última menstruação da mulher grávida). Os abortos em fases posteriores da gravidez até ao nascimento são permitidos se dois médicos certificarem que o aborto será realizado para evitar danos à saúde física ou mental da mulher grávida; risco à vida da gestante; ou que a criança sofrerá de uma doença particularmente grave reconhecida como incurável.

 

Referências

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: experiência vivida. Tradução de Sérgio Milliet. 2ª. ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1967.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos. Tradução de Sérgio Milliet. 4ª.ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1970.

ENGELS, Frederick. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. São Paulo: Civilização Brasileira, 1984.

FELDEN, Patrícia; COELHO, Paulo Vinícius Nascimento. A superação da condição de subjugação das mulheres e seu significado para a história humana (o pensamento de Simone de Beauvoir em diálogo com o materialismo histórico dialético). Sapere Aude: revista de filosofia, Belo Horizonte, v. 9, n. 18, p. 468-477, dezembro de 2018.

KIRKPATRICK, Kate. Simone de Beauvoir: Uma vida. São Paulo: Editora Crítica, 2020.

LÉVI-STRAUSS, Claude. Estruturas elementares do parentesco. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.

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[1] O Segundo Sexo (1949) dividido em dois volumes, O Segundo Sexo foi um importante tratado feminista, publicado por Simone de Beauvoir em 1949. No livro, a autora define “patriarcado”, expondo de que modos o sistema machista reproduz a opressão das mulheres.

[2] As principais ideias de Simone de Beauvoir giravam em torno dos conceitos de liberdade, responsabilidade e autenticidade. Ela aplicou essas ideias a vários domínios da existência humana, como ética, política, religião, arte e gênero. Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino

[3] A pensadora destrói a falácia biológica, demonstrando que ninguém nasce, por exemplo, com predisposição para cumprir tarefas domésticas. Pelo contrário, essas noções associadas ao gênero partem de ficções e construções sociais de um sistema de dominação masculina. Outro aspecto crucial do texto foi o fato de defender que os temas da esfera privada (relacionamentos íntimos e familiares, por exemplo) também eram questões políticas importantes que precisavam ser debatidas. Ou seja: “o privado é público”.

[4]  A base da proposta existencialista é analisar o ser humano em seu todo e não dividido em aspectos internos (sua mente, cognição e sentimentos) e externos (seu corpo, comportamento e ações). Existencialismo é uma doutrina filosófica centrada na análise da existência e do modo como seres humanos têm existência no mundo. Visa encontrar o sentido da vida através da liberdade incondicional, escolha e responsabilidade pessoal.

[5] “O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos.” Nesta passagem, Simone de Beauvoir fala de um tema bastante complexo: a forma como podemos contribuir para a própria opressão. Por serem condicionadas e manipuladas pelas normas patriarcais, algumas mulheres acabam reproduzindo estereótipos e discursos machistas.

[6] O aborto é autorizado em três casos no Brasil: gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. Nas demais situações, a interrupção da gravidez é considerada crime, de acordo com o Código Penal, de 1940. A legislação estabelece que a mulher que provocar um aborto em si mesma pode ser condenada a pena de 1 a 3 anos de prisão. Foi o Código Penal que fixou a possibilidade de aborto legal em caso de estupro. Já a interrupção da gravidez em caso de anencefalia do feto só foi permitida a partir de 2012, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Mulheres que atendem a esses critérios, porém, têm enfrentado obstáculos para ter acesso ao aborto legal no país.