Julgamento do STF da denúncia em face de Bolsonaro e outros indiciados

Gisele Leite

Professora universitária aposentada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito.
Presidente da Seccional RJ da ABRADE. Pesquisadora-chefe do INPJ. Trinta e sete obras jurídicas publicadas.
Articulista e colunistas dos principais sites jurídicos

 

A denúncia que fora apresentada pela Procuradoria-Geral da República será analisada pela Primeira Turma e, caso seja aceita, o  ex-Presidente e outros sete indiciados passarão a responder ao processo criminal. Tudo começou em 25 de março, e a PGR apontou  o núcleo principal como sendo o responsável do planejamento de golpe de Estado.

A Primeira turma rejeitou todas as preliminares em denúncia contra Bolsonaro, votos unânimes, com exceção da questão relativa à competência do STF para julgar o caso, com a divergência do Ministro Luiz Fux.

O Colegiado presidido por Cristiano Zanin reservou três sessões para analisar a denúncia. Foi lido o relatório por Alexandre de Moraes e, feitas as sustentações orais, tanto pela acusação quanto pelas defesas.

No rol de indiciados apontados na denúncia são: Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Almir Garnier Santos, Anderson Torres, General Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Souza Braga Netto. Frise-se que apenas Braga Netto permanece detido.

A acusação é referente seguintes crimes: crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A denúncia oferece farto acervo probatório que vai além do conteúdo da colaboração premiada de Mauro Cid.

Ocorreram as sustentações orais das defesas. O advogado do Almirante Garnier ironizou a acusação da PGR quando perguntou se cabe influenciar em silencio e se seria por telepatia. Cumpre destacar que o STF tem atuado como fiel guardião da Constituição brasileira e, suas decisões são livres das contaminações políticas e ideológicas.

Em tom erudito, o advogado do General Augusto Heleno iniciou sua sustentação citando Santo Agostinho, in litteris: “ele fala que a esperança tem duas filhas lindas – a indignação e a coragem, A indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão. E a coragem, excelências, a mudá-las.”

O causídico falou sobre três pontos: 1. A impossibilidade de divisão deste processo; 2. À necessidade do acesso de íntegra das provas, e não os informes de polícia judicial; e 3. Sobre a inépcia e falta de justa causa contra Augusto Heleno.

Já a defesa de Bolsonaro afirmou que: o Presidente da República não tem nenhuma relação com punhal verde e amarelo, operação luneta, com copa 22 e assim por diante.

A verificação das trocas de mensagem, a partir do momento que corréus dizem que falaram com comando militar, que pediram audiência no planalto no Alvorada, o que disseram? Isso não consta. É essa a importância de verificar toda a questão”.

O notável doutrinador e advogado Cezar Bitencourt sustentou a defesa de Mauro Cid e numa fala sucinta pediu que seja reconsiderada e não recebida a denúncia em relação a Mauro Cid, que cumpriu com seu mister e dever, pela circunstância de colaborador.

Já a defesa de Paulo Sérgio Nogueira questionou se é válida a delação do coronel Cid. Ou só valerá para recebimento da denúncia? A defesa de Braga Netto, a seu turno, ressaltou ser um homem de reputação ilibada e, afirmou que não teve qualquer participação ou relação com os fatos.

A defesa ainda pediu a nulidade do feito, posto que a defesa não teve acesso ao material bruto e, requereu a rejeição total da peça exordial, porque é baseada em acordo de colaboração premiada viciado e, porque não há uma única conduta criminosa descrita pelo Ministério Público.

Quanto à competência da Primeira turma, lembrou que, antes da mudança regimental promovida pela emenda 59/23, que transferiu a competência penal para as turmas, o plenário recebeu e processou 1.326 ações penais, reconhecendo a competência do STF.

Após a alteração, todas as novas denúncias passaram a ser analisadas pelas turmas, inclusive 168 ligadas ao 8 de janeiro. “O tratamento é igualitário a todos os acusados, a todos os denunciados. Não se justifica nenhum tratamento diferenciado”, afirmou.

Além disso, o ministro apontou que a Primeira Turma já afastou a preliminar de incompetência em outros casos de relevância, como os que envolvem a deputada Federal Carla Zambelli, o deputado Federal Domingos Brazão e o senador Sérgio Moro, entre outros.

Ao rebater a preliminar das defesas de Jair Bolsonaro e Walter Braga Netto, Moraes destacou que ambas já haviam recorrido por agravo regimental à própria turma, sem questionar a competência.

Ministro Alexandre de Moraes também votou por afastar a preliminar de nulidade com base na acusação de que a investigação seria fruto de “pesca probatória”. S. Exa. diferenciou uma investigação séria, complexa e supervisionada de uma apuração aleatória e sem foco, típica da “pesca probatória”.

As defesas alegaram nulidade por suposta ofensa ao sistema do juiz das garantias, mas ministro Alexandre de Moraes, rejeitou-a, lembrando que essa tese já havia sido afastada pelo STF na ADIn 6.298.

Na oportunidade, o Supremo assentou que a nova sistemática não se aplica aos processos de competência originária. Destacou que, apesar de o STF ter reconhecido a importância do sistema do juiz das garantias, houve decisão unânime pela sua inaplicabilidade nos processos que tramitam originariamente nos tribunais, como é o caso julgado. Todas as preliminares ficaram superadas nesse dia. Mas, prossegue hoje o julgamento da denúncia no dia 26.3.2025.

O Supremo reforçou a segurança antes do julgamento que pode tornar Jair Bolsonaro réu na ação penal relacionada à tentativa de golpe nas eleições de 2022. Nos últimos dias, a Corte registrou um aumento nas ameaças e xingamentos aos ministros, tanto na central telefônica quanto nos e-mails do STF. Em nota enviada à imprensa, o Tribunal informou que o reforço na segurança foi planejado com base em uma “análise de risco” e no “cenário atual”. Segundo o STF, a Secretaria de Polícia Judicial adotou medidas preventivas para garantir a segurança de todos.

Aguardaremos ansiosos cenas dos próximos capítulos do memorável julgamento dessa denúncia da PGR.