A Racionalização Processual e o Seguro
A Lei nº14.195, de 26 de agosto de 2021, alterou inúmeras leis extravagantes que orbitam em nossa “malha jurídica”, mas, o que, de fato, pretendo analisar, aqui, diz respeito a alterações efetivadas tanto na lei Processual Civil como em nosso Código Civil.
O artigo 1º dessa novel lei dispõe sobre a facilitação para abertura de empresas, protegendo acionistas minoritários, a facilitação do comércio exterior, o sistema integrado de recuperação de ativos, cobranças realizadas por conselhos profissionais, profissão de tradutor e intérprete público, obtenção de eletricidade, desburocratização societária e atos processuais e, por último, se referindo ao instituto da prescrição intercorrente na parte final deste artigo ao contextualizar o Código Civil.
Quanto ao atual Código Civil a Lei nova revoga o parágrafo único do artigo 1.015, que tratava do excesso por parte dos administradores em relação a terceiros da Sociedade Simples na Seção que prevê seu contrato social.
O outro artigo do Código Civil expressamente revogado, diz respeito ao inciso IV do caput e o parágrafo único do artigo 1.033, respectivamente, que tratava da falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de 180 (cento e oitenta dias), e do sócio remanescente na dissolução deste tipo social.
No Código de Processo Civil foram revogados os incisos I, II, III, IV e V do caput do artigo 246 no que tange ao procedimento de citação que é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual, ex vi legis, do artigo 238 do CPC.
A substancial alteração dos dois Códigos (CC e CPC) se opera na Lei vigente destacando-se como pano de fundo o artigo 44, que, em um Capítulo, o X, cuida DA Racionalização Processual, matéria subsumida no Código de Processo Civil.
Pois bem. No artigo 77 do atual CPC, no Capítulo referente aos Deveres das Partes e de seus Procuradores, se adiciona o inciso VII ressaltando suas obrigações no sentido de informar e manter atualizados seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário, e no caso do §6º do artigo 246 do CPC, quando se refere à administração tributária no caso de recebimento de citações e intimações.
Já no artigo 231 do CPC é adicionado o inciso IX que trata do dia do começo do prazo da citação realizada por meio eletrônico, que se dará no quinto dia útil seguinte à confirmação, na forma prevista na mensagem da citação. Assim, por exemplo, se uma seguradora receber uma citação por meio eletrônico ela terá 5 dias úteis, após confirmação do recebimento dessa citação eletrônica, para apresentar sua resposta ao pedido do segurado, ou de terceiro interessado, frente a uma indenização securitária.
Também foi aposto um parágrafo único no artigo 238 do CPC no sentido de que este ato processual – citação – deverá ser efetivado em até 45 (quarenta e cinco dias) a partir da propositura da ação.
Tautologicamente, no artigo 246 do CPC com nova redação, diz o legislador que a citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça.
É verdade que no § 1º deste artigo, só se determinam a obrigatoriedade desse procedimento às empresas públicas e privadas, como é o caso de qualquer empresa de seguro, a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio.
Imaginem, caros leitores e dedicadas leitoras, se se exigisse tal procedimento a cargo do segurado na hipótese de uma determinada seguradora, ou de um terceiro, postular aquela um pagamento indevido de uma quantia securitária que ela, eventualmente, entenda, posteriormente, que não era devida a teor do enunciado 876 do CC?
Buscar, depois, uma indenização julgada indevida a restituição de um pagamento de uma pessoa muitas vezes indeterminada como sói acontecer no seguro de responsabilidade civil que só é determinado com o efetivo pagamento e, mormente possuidor de parcos recursos. Como se resolveria?
Talvez por isto o legislador advertiu no § 1º-A que a ausência de confirmação, em até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, implicará a realização da citação pela forma convencional, outrora prevista nos incisos I a IV, e pelo meio eletrônico atualmente regulamentado pela nova lei no inciso IX do seu artigo 77, vale dizer, atual parágrafo único do artigo 231 do Código de Processo Civil.
Adiante. No § 1º – B do artigo 246 do CPC está dito que na primeira oportunidade de falar nos autos, o réu citado deverá apresentar justa causa para a ausência de confirmação do recebimento da citação enviada eletronicamente.
No § 1º C se considera ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa (cinco por cento) do valor estabelecido no processo o fato de deixar de confirmar no prazo legal, sem justa causa, o recebimento da citação recebida por meio eletrônico.
Essa novidade está, de fato, alinhada aos princípios de celeridade e efetividade processual, condizente com os meios eletrônicos implementados na modernização da Justiça.
Todavia, cautela é preciso para que não se atropele o devido contraditório, o due process of law, ou seja, o devido processo legal.
As citações por correio eletrônico com código identificador, e as microempresas serão cadastradas no sistema integrado da Rede Nacional para Simplificação do Registro e Legalização de Empresas e Negócios (Redesin), preveem os §§ 4º e 5º e o § 6º exige o compartilhamento de cadastro com órgão do Poder Judiciário finaliza o artigo 246 com a nova redação do CPC.
O artigo 247 do CPC, com nova roupagem, diz que a citação será feita por meio eletrônico ou pelo correio para qualquer comarca do país, com exceção dos incisos atuais do artigo 247 do CPC.
Os atuais incisos do artigo 397 do CPC permanecem como se encontram redigidos, só que com um modelo mais atual e moderno.
Por fim no artigo 921, inciso III, do Código de Processo Civil haverá a Suspensão e Extinção do Processo de Execução, quando não for localizado o executado ou bens penhoráveis. Enfim, não se pode procrastinar o feito indefinidamente. É a paz social reclamada pela prescrição.
O termo inicial e a efetiva citação são tratados no §4º e 4º A, respectivamente, desse artigo acima referido.
A atividade do julgador diz a novel Lei poderá ser reconhecida de ofício, assim como a alegação de nulidade no caso de demonstração da ocorrência de efetivo prejuízo ao prejudicado.
Finalmente, o § 7º diz que o disposto no artigo 921 aplica-se ao cumprimento de sentença nos termos plasmados pelo artigo 523 do Código de Processo Civil.
Por último uma curiosidade me assolou. A prescrição intercorrente que é a perda do direito de exigir um direito pela ausência de ação durante um certo lapso de tempo no curso do processo, foi previsto no capítulo IX da lei, que trata Da desburocratização Empresarial e dos atos Processuais e da Prescrição Intercorrente, quando o artigo 206 – A, diz que “a prescrição intercorrente observará o mesmo prazo de prescrição da pretensão -, anspruch do direito alemão, criação de Windscheid, jurista germânico– observadas as causas de impedimento de suspensão e de interrupção da prescrição neste Código (só pode ser do Código Civil) e observado o disposto no art. 921 da Lei nº13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil)”.
São estas as ligeiras e breves considerações que faço ao iniciar, com efeito, uma nova era digital em sede de processo civil que determinam como as Partes e o Juiz deverão proceder na era tecnológica, assim como o direito substantivo deve ser adaptado nestes novos tempos de modernidade.
Porto Alegre, 31 de agosto de 2021
Voltaire Marensi
Advogado e Professor