A Lei Complementar 207 e as Atuais Reformas

Voltaire Marenzi

Advogado e Professor

 

A Lei Complementar nº 207, de 16 de maio de 2024, trouxe significativas atualizações no campo do direito e da Responsabilidade Civil no Brasil, com particular impacto sobre os Seguros de Responsabilidade Civil Obrigatório o SPVAT, novel nomenclatura revogando o antigo DPVAT.[1]

Esta legislação busca modernizar e aperfeiçoar a estrutura jurídica existente, proporcionando maior clareza e eficiência na proteção dos direitos das vítimas de acidentes de trânsito.

Uma das principais alterações introduzidas pela Lei Complementar nº 207/2024 é o reforço do conceito de responsabilidade civil, especialmente no que tange à responsabilidade objetiva em acidentes de trânsito.

As principais inovações, a meu sentir, são:

A Responsabilidade objetiva foi ampliada. A lei dá um maior elastério a este instituto jurídico, com a finalidade de que a responsabilidade objetiva inclua novos casos, simplificando, outrossim, o processo de indenização para as vítimas de acidentes. Agora, a responsabilidade não se limita apenas aos proprietários dos veículos, mas também abarca os condutores e outros envolvidos que possam ser diretamente responsabilizados pelo acidente.

A nova Lei Complementar revisa os valores de indenização pagos pelo antigo seguro DPVAT, ajustando-os às necessidades atuais das vítimas de acidentes de trânsito.

Tais mudanças implicam no reajuste dos valores de cobertura.

Os valores das indenizações para casos de morte, invalidez permanente e despesas médicas foram reajustados para refletir a inflação e o custo real dos tratamentos médicos e de reabilitação.

A lei também estabelece a atualização anual dos valores de indenização com base em índices econômicos oficiais, garantindo que as indenizações mantenham seu poder de compra ao longo do tempo.

Para facilitar o acesso das vítimas às indenizações, a Lei introduziu uma série de medidas destinadas a simplificar os procedimentos de requerimento, a saber:

  • Processo Digitalizado: implementação de um sistema totalmente digital para a solicitação e acompanhamento das indenizações, reduzindo a burocracia e agilizando o pagamento dos benefícios;
  • Documentação Simplificada: Redução do número de documentos exigidos para a comprovação dos danos e a solicitação das indenizações, tornando o processo mais acessível a todos os cidadãos.

A Lei Complementar nº 207/2024 em pauta objetiva estabelecer novas medidas para combater fraudes no sistema de seguros, tais como:

  • Fiscalização Rigorosa: A criação de uma unidade especial para a fiscalização e auditoria dos processos de indenização, com o objetivo de identificar e prevenir fraudes de maneira mais eficaz;
  • Penalidades Mais Severas: A lei prevê penalidades mais severas para fraudes comprovadas, incluindo multas elevadas e penas de reclusão para os responsáveis.

A nova legislação também cuida de detalhar os direitos de regresso das seguradoras[2] contra os segurados em casos específicos:

  • Culpa Grave e Dolo: As seguradoras têm o direito de regresso, rectius, sub-rogação legal, contra os segurados que atuarem com dolo ou culpa grave, permitindo a recuperação dos valores pagos em indenizações nesses casos.
  • Cláusulas Contratuais: A lei permite a inclusão de cláusulas específicas nos contratos de seguro, estabelecendo de forma clara as condições sob as quais a sub-rogação pode ser exercida.

A Lei Complementar nº 207, de 16 de maio de 2024, representa um marco importante na evolução da legislação de seguros e responsabilidade civil no Brasil. Ao modernizar e ajustar os mecanismos de proteção às vítimas de acidentes de trânsito, a lei busca oferecer uma resposta mais eficaz e justa aos desafios contemporâneos, promovendo maior transparência, eficiência e justiça no sistema de seguros e na reparação de danos. Com essas alterações, espera-se uma melhoria significativa na experiência dos cidadãos que necessitam acessar esses benefícios, além de um fortalecimento do combate às fraudes e abusos no sistema.

Porém, a par desta nova Lei Complementar se permanece mais isolado das demais normas legais que gravitam no atual Direito do Seguro. Portanto, é imprescindível fortalecer a proteção aos terceiros lesados, assegurando maior clareza nas obrigações dos segurados e seguradoras, promovendo um ambiente mais justo e eficiente para a resolução de questões envolvendo acidentes de trânsito. A harmonização das regras de responsabilidade civil com as especificidades do seguro visa garantir que as vítimas de acidentes de trânsito recebam a devida reparação de forma célere e justa, refletindo um avanço significativo na legislação brasileira.

De outro giro, a Lei Complementar nº 207, de 16 de maio de 2024, representa, sem dúvida, um marco importante na evolução da legislação de seguros e responsabilidade civil obrigatória no Brasil.

Ao modernizar e ajustar os mecanismos de proteção às vítimas de acidentes de trânsito, a lei busca oferecer uma resposta mais eficaz e justa aos desafios contemporâneos, promovendo maior transparência, eficiência e justiça no sistema de seguros e na reparação de danos.

Todavia, é necessário que exista um diálogo das leis no sentido de que se promova uma interação e comunicação entre as várias leis que tratam da matéria, a exemplo do projeto de Lei nº 29/2017 – Lei de Seguros, assim como do projeto de Reforma do atual Código Civil, que deve retornar à Câmara dos Deputados.

O encadeamento de todas estas leis deve consistir na promoção, harmonização e na coerência jurídica, respeitando e harmonizando o todo, cuja finalidade é a segurança jurídica.

Pois bem. Com a obtenção de um sistema jurídico uniforme, promoveremos uma maior coesão e integração legislativa contribuindo para um ambiente legal mais harmonioso e previsível para um mundo moderno e atual.

 

Porto Alegre, 31/07/2024.

 

[1] Artigo 28 da Lei Complementar 202, artigo 28, inciso I.

[2] Artigo 346, inciso III do atual Código Civil.