
Voto divergente: Ministro Fux vota para absolver Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado
Gisele Leite
Professora universitária há 3 décadas; Mestre em Direito; Mestre em Filosofia; Doutora em Direito; Pesquisadora – Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas; 29 obras jurídicas publicadas; Articulistas dos sites JURID, Lex Magister; Portal Investidura, Letras Jurídicas; Membro do ABDPC – Associação Brasileira do Direito Processual Civil; Pedagoga; Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual, Revista de Direito Trabalho e Processo, Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores – POA – RS
Primeiramente, cumpre observar que o voto do Ministro Fux foi maior do que o voto e relatório do Ministro Relator. Depois dos votos do Ministro Relator, Alexandre de Moraes e Ministro Flávio Dino, o placar está em 2×1 pela condenação do ex-presidente.
Cumpre observar que todo processualista é, antes de tudo, um detalhista.
A sessão do dia 10 de setembro de 2025, a primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, com o voto do Ministro Luiz Fux que votou pela absolvição do ex-presidente no julgamento da trama golpista de2022. Divergiu do relator e do Ministro Dino que já tinham votação pela condenação de todos os réus.
Doravante faltam somente os votos da Ministra Cármen Lúcia e Cristiano Zanin que é o presidente da primeira turma da Suprema Corte.
O Ministro Fux pontificou inexistirem provas suficientes e cabais para imputar a Bolsonaro os cinco crimes apontados pela PGR. Resta, então a imputação do delito de organização criminosa, a respeito do qual, já havia esclarecido que um suposto plano criminoso, por si só, não é suficiente para caracterizá-lo.
Também se manifestou pela absolvição de Bolsonaro e Almir Garnier e, quanto ao colaborador Mauro Cid, o Ministro Fux votou pela condenação pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Outras divergências surgiram pois ao julgar as preliminares da AP 2668, o Ministro Fux afirmou que o caso deveria ser anulado porque o STF não teria a competência para julgá-lo. Caberia a competência da primeira instância.
O Ministro Fux afastou a responsabilidade penal de Bolsonaro pelos atos de oito de janeiro de 2023 pois entendeu ser inexistente o nexo causal entre os discursos proferidos durante a campanha e a invasão e destruição das sedes dos Três Poderes. Mesmo que sustentasse que existiram incentivos à violência, seria necessário demonstrar que o resultado foi consequência provável e previsível daquela manifestação de vontade, afirmou o Ministro Fux.
Rejeitou também que Bolsonaro teria utilizado a chamada ABIN paralela, utilizando-a de forma ilegal. A atuação do órgão, ainda que por meios reservados, limitou-se à coleta e análise de informações previstas em lei, sem aptidão para configurar crime contra o Estado Democrático de Direito.
“A atividade de inteligência, ainda que com desvio de finalidade, não tem nenhuma aptidão para configurar o crime previsto no artigo 359-M do Código Penal”, afirmou ao descartar as imputações.
Quanto ao questionamento sobre as urnas eletrônicas e a atuação do Justiça Eleitoral também foram discutidos por Fux em seu voto. Para ele, a simples apresentação de ações ou representações ao TSE não pode ser criminalizada como atentado ao Estado Democrático de Direito, já que constitui exercício da garantia constitucional de acesso à Justiça. “Representar o Tribunal Superior Eleitoral não é crime, é garantia de acesso à Justiça”, afirmou.
O ministro acrescentou que, em seu interrogatório, Bolsonaro “reforçou sua postura de boa-fé” e que sua intenção era buscar a verdade dos fatos sobre o funcionamento do sistema de votação.
O Ministro Fux também analisou as acusações de que a Polícia Rodoviária Federal (PRF) teria atuado para dificultar a votação de eleitores no dia 30 de outubro de 2022.
O ministro destacou que o Ministério Público não apresentou provas de ciência ou participação de Bolsonaro nesses fatos, restringindo-se a atribuir condutas a Anderson Torres, Silvinei Vasques e outros ex-integrantes do governo. “Quanto a isso, o Ministério Público, em momento algum, apresentou provas da ciência ou da participação de Jair Bolsonaro nos fatos”, afirmou, ao rejeitar a responsabilização do ex-presidente.
A respeito da minuta do golpe, referente ao Punhal Verde-amarelo, o Ministro Fux afirmou que não passava de mera carta de lamentações, e quando muito
teria sido somente mera cogitação ou atos preparatórios, e assim, tal conduta não seria punível, posto que não aconteceu nada. Afirmou que não há nenhum elemento indicando que essa versão da minuta tenha sido de fato apresentada a Bolsonaro ou aos comandantes das Forças Armadas. Ressaltou ainda que as reuniões apontadas pela PGR ocorreram em novembro de 2022, porém a primeira versão da referida minuta somente surgiu em dezembro do mesmo ano, o que demonstra forte contradição na peça acusatória.
Na sequência, ainda destacou que os depoimentos de Mauro Cid e dos comandantes militares reforçaram a ausência de atos executórios. Pois o ex-presidente não assinou e nem assinaria esse documento, conforme confirmou o delator e, ainda frisou que qualquer medida dependeria diretamente de ordem formal de Bolsonaro.
E, para o Ministro Fux, tais relatos evidenciam que tais debates permaneceram como mera cogitação, sem que houvesse efetiva preparação para golpe de Estado.
O ministro Fux votou pela condenação do colaborador Mauro Cid pela crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, e, reverenciou as provas colacionadas nos autos que comprovam a participação do ex-ajudante de ordens na trama golpista, traduzindo-se em autoincriminação involuntária. Confirmou a homologação da colaboração premiada de Mauro Cid.
Ressaltou o Ministro Fux que o que o crime de golpe de Estado está absorvido pela tentativa de abolição violenta, afastando condenação específica nesse ponto. Já quanto às acusações de organização criminosa e de dano qualificado, absolveu Cid, ao afirmar que não há provas de que ele tenha integrado grupo estruturado para a prática indeterminada de crimes.
Já quanto o réu Almir Garnier, o Ministro Fux afastou todas as imputações, tanto que não convocou as tropas para apoiar o golpe de Estado, de forma, que entre o apoio à tentativa de golpe e a efetiva prestação de auxílio existe sensível distância que não fora percorrida pelo réu.
Ressaltou o Ministro Fux que a tendência punitivista enxergou a participação em reuniões e a colocação de tropas a disposição só seriam de fato punidas no caso de haver concreto início da execução criminosa e de golpe de Estado.
O Ministro Fux se juntou ao relator, Alexandre de Moraes, e ao ministro Flávio Dino, que mantiveram a delação, mas devem analisar ainda a extensão dos benefícios. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, em alegações finais, manteve a delação, mas as vantagens devem ser proporcionais ao que ele colaborou no processo.
Quando abriu as primeiras divergências mais substanciais no julgamento da ação penal. Divergiu dos ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino em relação às demais preliminares levantadas pelas defesas e votou pela anulação de todo o processo, ao considerar que o STF é incompetente para julgar a ação. Para ele, quando a denúncia foi oferecida pela PGR, nenhum dos réus tinha prerrogativa de foro ou estava no exercício de cargo que justificasse a competência da Corte.
Sendo o terceiro julgador a votar, o ministro também acolheu a preliminar da defesa sobre a incompetência da 1ª Turma para conduzir o julgamento e, com isso, reconheceu a nulidade de todas as decisões do colegiado. “Ao rebaixar a competência original do Plenário para uma das Turmas, estaríamos silenciando as vozes de ministros que poderiam esterilizar a forma de pensar sobre os fatos a serem julgados nesta ação penal”, afirmou.
O ministro foi favorável à suspensão da ação penal em relação ao deputado Alexandre Ramagem. Ele responde pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado, uma vez que a Câmara dos Deputados já havia suspendido o andamento dos delitos de dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
“Nenhuma lei penal pode retroagir em prejuízo do réu, somente em benefício. Fatos praticados em 2023 não seriam considerados crimes hediondos”, disse Theo Dias, professor fundador do Curso de Graduação da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Segundo Filipe Papaiordanou, advogado criminalista e professor, “os fatos que o PL da anistia está buscando anistiar são anteriores, de 8 de janeiro de 2023, de modo que qualquer lei que mude o quadro penal material para pior não pode ser aplicada”.
A discussão sobre a eventual concessão da anistia, contudo, vai além. Mesmo que o projeto sobre o tema se torne lei, advogados acreditam que a constitucionalidade do texto será questionada.
A Constituição Federal brasileira vigente entende que são “inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia” a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos.
O ministro Flávio Dino, da 1ª Turma do STF, citou em seu voto que crimes atentatórios ao Estado democrático de Direito “já foram declarados pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal como insuscetíveis de indulto ou anistia”.
Lembremos que atualmente exaltado por apoiadores de Jair Bolsonaro por conta da divergência que está abrindo no julgamento do ex-presidente no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Fux foi indicado à Corte pela então presidente petista Dilma Rousseff em 2011. Fux começou a carreira como promotor de Justiça no Rio de Janeiro, na década de 1970, antes de ingressar na magistratura em 1983.
Passou pelo Tribunal de Justiça do Rio e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Também é professor titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e reconhecido acadêmico de Direito Processual. O ministro já foi considerado um dos mais punitivistas da Corte, conhecido por agir com dureza no caso do Mensalão e por chancelar as decisões da operação Lava Jato.
Ele defendeu, por exemplo, a prisão em segunda instância antes do esgotamento dos recursos — o que afetou diretamente casos como o do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso e condenado no contexto da Lava Jato.
Em 2019, nas conversas vazadas pelo site The Intercept Brasil de procuradores e juízes da operação, ficou famosa a mensagem que o então juiz Sérgio Moro enviou ao procurador Deltan Dallagnol: “In Fux we trust” (“Em Fux nós confiamos”, em inglês).
Nesta quarta-feira, em seu longo voto no julgamento de Bolsonaro e mais sete réus, Fux pediu a anulação do processo por considerar que o STF e a Primeira Turma não teriam competência para julgar o caso.
Afirmou in litteris, o Ministro Fux: “Foram 161 dias entre o recebimento da denúncia e o início do julgamento, cerca de cinco meses. Estou há 14 anos no Supremo Tribunal Federal e julguei processos complexos, como o Mensalão. O processo levou dois anos para receber a denúncia e cinco anos para ser julgado”.
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (10) para condenar o ex-ministro da Casa Civil, general Walter Braga Netto, pelo crime de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. Com isso, já há maioria para condenar Braga Netto pelo crime.
“O réu Braga Netto, em unidade com Rafael Martins de Oliveira e Mauro César Barbosa Cid, planejou e financiou o início da execução de atos de destinados a ceifar a vida do relator dessa ação penal, o ministro Alexandre de Moraes”, disse o Ministro Fux.
Segundo a acusação, Braga Netto integrava o núcleo central da organização, com influência política e militar. A PGR cita como prova documentos como a chamada Operação 142, apreendida em sua assessoria, que previa ofensivas contra o STF e decretos de exceção para impedir a posse de Lula.
Em resumo, o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concluiu na noite desta quarta-feira (10) seu voto na Ação Penal (AP) 2668, votando pela absolvição de Almir Garnier, Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Paulo Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e Anderson Torres das acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR) relativas à tentativa de golpe de Estado.
Ele votou pela condenação de Mauro Cid e Walter Braga Netto apenas pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O julgamento será retomado nesta quinta-feira (11.09.2025), às 14h.
O voto do Ministro Fux durou mais de onze horas e, só condenou Braga Netto e Mauro Cid. Os demais réus, portanto, foram inocentados.
Chegou a afirmar que as provas colacionadas nos autos apenas denotam que o réu (Bolsonaro) tinha somente o intuito de buscar a verdade dos fatos sobre o sistema eletrônico de votação, mesmo nos diversos questionamentos que fez sobre as urnas eletrônicas ao longo de sua presidência da República.
Entre os principais argumentos do Ministro Fux destacaram-se: a incompetência absoluta do STF para o julgamento, cerceamento de defesa pois houve o chamado document dump que é referente um volume excessivo de documentos correspondente a setenta terabytes. Declarou ser válida a delação premiada feita por Mauro
Cid. Vetou a caracterização do crime de organização criminosa, pois havia apenas grupo de pessoas que teria atuado para cometer delitos e sem utilização de armas de fogo. Citou ainda o caso do mensalão para reforçar o mesmo entendimento feito à época.
Consignou que os discursos contendo ataques aos outros Poderes não servem para a configuração do crime de abolição do Estado Democrático de Direito, ele se aplica aos acampamentos perto dos quartéis.
Para haver os embargos infringentes segundo a normativa do STF prevê que, em decisões do Plenário, o mínimo necessário são quatro votos divergentes. Mas não há previsão regimental para a quantidade de divergência nas Turmas.
Desde o caso Maluf, em 2018, o entendimento é de que deve haver dois votos minoritários “absolutórios em sentido próprio”, ou seja, que digam respeito à absolvição no mérito. Na ocasião, os ministros analisavam a Ação Penal 863, em que o então deputado federal afastado Paulo Maluf foi condenado pelo crime de lavagem de dinheiro. A decisão foi contrária a Maluf.
A votação a respeito dos requisitos, contudo, não foi unânime. Além da discussão sobre os votos, o próprio caráter das divergências não está pacificado.
“Não há clareza na jurisprudência do Supremo sobre embargos nas Turmas. Há incerteza sobre qual divergência seria passível do recurso”,
Em resumo, o Ministro Fux migrou do in dubio pro societate para in dubio pro reo.