Modernização, Desenvolvimento e Fortalecimento do Seguro
Desta vez a Superintendência de Seguros Privados – Susep -, em meu entender, somente sob o ponto de vista formal, procedeu com acerto ao exarar a Resolução CNSP nº 431, de 12 de novembro de 2021.
A uma, porque respeitou dentro do princípio da hierarquia das leis o que prevê o inciso VII, do artigo 59 da Constituição Federal, que trata da matéria exposta sob a forma de Resolução.
A duas, porque a Resolução em pauta diz respeito a assuntos imbricados com a própria atuação de órgão fiscalizador do mercado. Neste sentido, quando o § 1º do artigo 1º afirma ser representante de seguros, a pessoa jurídica que assume a obrigação de promover, ofertar ou distribuir produtos de seguros, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, à conta e em nome de sociedade seguradora, está normatizando, em princípio, regras atinentes à sua atividade.
Em outras palavras. Cuida-se de procedimento inerente à presentante de pessoa jurídica, a teor do artigo 40 do Código Civil, a ser adotado na área securitária. Até aí, nada a opor por parte desse cronista estimados leitores e caras leitoras!
Porém, a meu sentir, logo em seguida, vale dizer no art. 2º, há um preceito de absoluta incompatibilidade material com a lei ao dizer que “é vedada a atuação de corretor de seguros e seus prepostos como representante de seguros. ” Sic, da Resolução.
Enfatizo isso em função de entender que o artigo 122 e 123, §2º, do Decreto-Lei n° 73, de 21 de novembro de 1966 e suas posteriores alterações, ainda continua vigente, afirmando que o corretor de seguros, pessoa física ou jurídica, é o intermediário legalmente autorizado a angariar e promover contratos de seguros, além de estabelecer naquele parágrafo do último artigo acima citado, que ele poderá ter prepostos de sua livre escolha.
Do mesmo modo esta é a leitura que se dessume do contrato de corretagem prevista no artigo 722 do nosso Código Civil, em um sentido lato.
A vedação da atuação de pessoa jurídica como representante de seguros e como estipulante ou subestipulante de apólice coletiva– art. 3º – me parece correta e adequada uma vez que ele é o intermediário legal do seguro no qual envolve o interesse da seguradora e do segurado.
Todavia, salvante entendimento diverso, a figura de representante de seguros que poderá atuar na intermediação de contratação de apólice coletiva, observada a necessidade de existência de vínculo estreito, claro e inequívoco entre o estipulante da referida apólice e o grupo segurado – artigos 4º e 5º – também não me agradam. Faço tal assertiva em razão do que determina o §2º do artigo 21 do Decreto-Lei nº73/66, que dispõe, laconicamente, que “nos seguros facultativos o estipulante é o mandatário dos segurados”.
Entretanto, como no-lo diz Gustavo Tepedino, ao comentar o artigo 653 do Código Civil, “a representação, como técnica jurídica, não se restringe à prática de negócios, podendo se traduzir em qualquer manifestação de vontade do representante em face de terceiros (titulares de outras situações jurídicas subjetivas), de modo a vincular o representado”. (Comentários ao Novo Código Civil, volume X, Editora Forense. 2008, página 39).
Será que a Resolução neste particular não extrapola a lei delimitando e particularizando modos de atuação do mandatário?
Pois bem. A Resolução é um texto que tem por finalidade regulamentar à Lei.
O regulamento, ensina mestre Pontes de Miranda, não é mais do que auxiliar das leis, auxiliar que sói pretender, não raro, o lugar delas, mas sem que possa, com tal desenvoltura, justificar-se e lograr que o elevem à categoria de lei. Quanto menos se regulamenta melhor. Tem-se visto prurido de regulamentar ir à vesânia de se reproduzirem, nos regulamentos, artigos e mais artigos de lei, sobrepondo-lhes, aqui e ali, frases que os interpretem, restritiva e ampliativamente. Tudo isso é inútil e é perigoso. (Comentários à Constituição de 1946, volume 2º, página 411, artigo 87, inciso I, com paralelo na atual CF de 1988, inciso IV).
Todavia, a mídia informa que a alteração implementada é decorrente de modelo de negócios conhecido como MGA Managing General Agent nas economias mais desenvolvidas. A sigla MGA – Agente Administrativo Geral – “provavelmente terá uma aparência muito diferente das do passado e precisará pensar e se comportar muito mais como uma seguradora”. Willistowerswa.com
Qual será o futuro dos corretores de seguros atualmente?
As outras regras previstas na sobredita Resolução giram em torno do escopo de atuação, remuneração do representante, aspectos operacionais, organizações varejistas e atos de disposições finais e transitórias.
Sua vigência passa a operar em 1º de dezembro do corrente ano.
Neste sentido, antes de continuar qualquer outro comentário sobre estes artigos insertos na Resolução acima identificada, questiono se essas regras vão encontrar eco no atual ordenamento jurídico, quando institutos velhos e bolorentos – Vide Decreto-Lei nº 73/66 – elevado ao grau de Lei Complementar, com 55 anos de existência (ela completa em 21 deste mês), ex vi legis, do que determina o inciso II do artigo 59 da CF/88, estão, malgrado o decurso do tempo, ainda vigentes?
Acredito, firmemente, que materialmente essa Resolução é natimorta!
Não sei qual será o posicionamento do novo Superintendente da Susep que é oriundo da classe dos corretores de seguro.
Uma coisa eu sei. Uma vez mais a Susep se destaca, a meu modo de ver, em total dissintonia com a legislação que rege nosso sistema federativo.
Antes de tudo, é preciso mudar leis para que normas de hierarquia inferior não entrem em testilhas com aquelas, que bem ou mal, representam a estrutura legal de nosso arcabouço jurídico.
Afrontar a lei nunca. Desrespeitá-la jamais, sob pena do ativismo judiciário grassar cada vez mais em nosso país, o que seria deplorável.
Porto Alegre, 16 de novembro de 2021
Voltaire Marensi
Advogado e Professor