
Auxílio-Acidente: Natureza, Requisitos e Desafios na Aplicação do Benefício Previdenciário
Fabrício Barcelos Vieira
Especialista em Direito Previdenciário. Membro da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB Franca/SP.
Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar os principais aspectos legais e práticos do benefício previdenciário denominado auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei nº 8.213/1991. Trata-se de uma prestação de natureza indenizatória, devida ao segurado do INSS que, após a consolidação de lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, apresente redução permanente da capacidade para o trabalho habitual. Apesar de sua relevância, o auxílio-acidente permanece subutilizado, sendo pouco conhecido tanto por segurados quanto por operadores do direito. O estudo aborda os requisitos legais, a evolução legislativa, a jurisprudência consolidada e os desafios contemporâneos em sua concessão, especialmente após a MP 905/2019, a Reforma da Previdência (EC 103/2019) e as mudanças no tratamento da qualidade de segurado. Ao final, propõe-se uma reflexão crítica sobre a necessidade de maior visibilidade e acesso a este direito, que cumpre papel essencial na proteção do trabalhador lesionado.
Palavras-chave: auxílio-acidente; previdência social; incapacidade; INSS; benefício indenizatório.
1 INTRODUÇÃO
O auxílio-acidente ocupa posição singular no sistema previdenciário brasileiro. Embora previsto na Lei nº 8.213/1991 desde sua origem, é um benefício frequentemente negligenciado por segurados, advogados e até mesmo pelo
próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Com caráter eminentemente indenizatório, visa compensar o trabalhador que, após acidente, ainda que não totalmente incapacitado, apresenta redução da capacidade laboral para a atividade que exercia habitualmente.
Apesar de sua relevância social, o benefício ainda enfrenta uma série de entraves, como escassa doutrina, reduzido número de julgados e interpretações restritivas por parte da autarquia previdenciária. A necessidade de consolidação das lesões, a demonstração do nexo causal e as alterações trazidas pela MP 905/2019 e pela EC 103/2019 geraram discussões importantes sobre sua abrangência, cálculo e duração.
Neste contexto, o presente artigo propõe-se a sistematizar os elementos fundamentais para a compreensão, aplicação e defesa do auxílio-acidente, contribuindo para seu efetivo reconhecimento como instrumento de proteção ao trabalhador lesionado.
2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DO AUXÍLIO-ACIDENTE
Nos termos do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, o auxílio-acidente é devido ao segurado que, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, apresentar sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho habitual.
A natureza do benefício é indenizatória, e não substitutiva da renda. Isso significa que o segurado pode continuar exercendo atividade remunerada normalmente, acumulando o benefício com seu salário (MARTINS, 2023).
3 REQUISITOS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS
Para a concessão do auxílio-acidente, são exigidos os seguintes requisitos: qualidade de segurado no momento do acidente; ocorrência de acidente de qualquer natureza; redução parcial e permanente da capacidade laboral; e nexo causal entre o acidente e a limitação funcional. Não há exigência de carência (art. 26, I, da Lei 8.213/91), e tampouco grau mínimo de lesão.
O Tema 416 do STJ reconhece que mesmo lesões mínimas podem gerar o benefício.
4 ESPÉCIES E BENEFICIÁRIOS
Há duas espécies de auxílio-acidente: o decorrente de acidente ou doença do trabalho (B94) e o decorrente de acidente de qualquer natureza (B36).
São beneficiários os empregados, trabalhadores avulsos, empregados domésticos e segurados especiais. Contribuintes individuais e facultativos estão excluídos (CASTRO; LAZZARI, 2022).
5 CÁLCULO E VALOR DO BENEFÍCIO
O valor corresponde a 50% do salário de benefício. A MP 905/2019 alterou temporariamente esse cálculo, mas foi revogada pela MP 955/2020. O cálculo segue a média das contribuições conforme as regras vigentes na data da concessão (STJ, Jurisprudência em Teses n. 198).
6 DATA DE INÍCIO, DURAÇÃO E CESSAÇÃO
O benefício pode iniciar após cessação de auxílio-doença ou na data da citação judicial. Dura até a véspera da aposentadoria ou do óbito do segurado.
O STJ, no REsp 1.095.523/SP, fixou a data da citação como marco inicial quando não houver auxílio-doença anterior.
7 QUALIDADE DE SEGURADO E CONTROVÉRSIAS
A Lei 13.846/2019 modificou o art. 15 da Lei 8.213/91, retirando o auxílio-acidente do rol de hipóteses de manutenção da qualidade de segurado. Doutrina e jurisprudência divergem sobre o fato gerador do benefício: se é o acidente ou a consolidação das lesões.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O auxílio-acidente é instrumento essencial de compensação previdenciária ao trabalhador lesionado.
Seu desconhecimento, aliado à complexidade técnica de sua aplicação, reforça a necessidade de maior atuação da advocacia previdenciária e de políticas de conscientização.
A valorização desse direito pode significar mais justiça e dignidade àqueles que, mesmo com limitações, continuam contribuindo com seu trabalho.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 jul. 1991.
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 41. ed. São Paulo: Atlas, 2023.
STJ – Superior Tribunal de Justiça. Jurisprudência em Teses. Edição 198 e 199. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/teses. Acesso em: 10 jul. 2025