Seguro do Caminhoneiro

Atendendo convite formulado pela Rádio Justiça para comentar decisão exarada pelo TRT-12, sob uma chamada divulgada na imprensa de que empresa deve contratar seguro de vida para motorista profissional, a 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), entendeu, à unanimidade, que o motorista profissional empregado por uma empresa que não teria feito seguro para seus empregados, deverá pagar o equivalente ao seguro de indenização por danos materiais a familiares daquele, que foi atropelado em pleno desempenho de sua atividade profissional.[1]

 

A ementa do acórdão é clara, ao registrar, verbis:

“Entre os direitos assegurados legalmente ao motorista profissional empregado figura o seguro de contratação obrigatória custeado pelo empregador, para cobertura inclusive de morte natural, conforme previsão do art. 2º, inciso V, alínea “c”, da Lei nº 13.103/2015. A ausência de contratação do referido seguro pela empregadora atrai o dever de indenizar, em caso de sinistro, independentemente de ter concorrido ou não para a ocorrência deste”.[2]

A lei de regência à espécie é a de nº 13.103, de 2 de março de 2015, que determina, o dever da empresa o benefício de seguro como contratação obrigatória assegurado e custeado pelo empregador, destinado à cobertura de morte natural, morte por acidente, invalidez total ou parcial decorrente de acidente, traslado e auxílio para funeral referentes às suas atividades, no valor mínimo correspondente a 10 (dez) vezes o piso salarial de sua categoria ou valor superior fixado em convenção ou acordo coletivo de trabalho.[3]

Examinando, especificamente, o artigo 21 da lei acima ventilada se verifica que o legislador revogou alguns artigos de uma outra lei pertinente ao tema no ano de 2012.

O que convido a atenção de nossas caras leitoras e distintos leitores, é que no Decreto-Lei que trata do Sistema Nacional de Seguros Privados, está dito em seu artigo 20, que, sem prejuízo do disposto em leis especiais, há a obrigatoriedade de outros seguros obrigatórios, além dos que estão ali taxativamente elencados.[4]

Pois bem. Há, de fato, uma lei especial determinando a obrigatoriedade de uma empresa transportadora de carga, assim como autônomos de carga, contratarem seguro obrigatório para motoristas profissionais.

Neste diapasão está em sintonia com a previsão legal a decisão emanada pelo sobredito Tribunal, quando destaca que “ao não cumprir o dever de contratar o referido seguro (fato incontroverso nos autos), a reclamada – uma empresa transportadora – causou às reclamantes, companheira e filha do de cujus, dano material equivalente ao valor do seguro que lhes foi sonegado.[5]

Destarte, malgrado o motorista não ter agido com cautela e prudência, inclusive desprezando normas básicas de circulação de veículos, incorrendo em culpa exclusiva devidamente evidenciado nos autos, a empresa deve responder pela morte da vítima em razão do evento fatal uma vez que não fez seguro previsto em lei específica sobre o tema em pauta.

O grande hermeneuta Carlos Maximiliano já doutrinava com proverbial acuidade que “essa ciência, vale dizer, a hermenêutica, tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para se determinar o sentido e o alcance das expressões legais”.[6]

“As normas jurídicas, dizia o jurista lusitano, Cunha Gonçalves, podem estar em diversas relações entre si. Ou são independentes, tendo cada uma o seu objeto e fim; ou coordenadas, condicionando-se e integrando-se, segundo os casos”.[7] (Sic).

Foi o que ocorreu no caso sub judice.

As normas supletivas, ou as normas integrativas que orbitam nosso ordenamento jurídico asseguram o fiel cumprimento do bom direito.

Em síntese apertada. Se o empresário, no caso concreto, não honrou com o compromisso de assegurar ao seu empregado através de uma norma que concedia direito aos seus prepostos, deverá arcar com o ônus de pagar um valor arbitrado pelo Judiciário, que, neste sentido, vem impor ao empregador uma norma já existente coordenada em perfeita adequação com a lei securitária, que trata do tema em foco de uma forma mais abrangente.

Essa na verdade é sua função, mormente quando a lei é relegada ao oblívio por uma empresa que coloca bem em risco à população.

Porto Alegre, 28/07/2022

Voltaire Marensi

Advogado e Professor

 

[1] Conjur.com.br. (26/07/2022).
[2] Processo nº 0001213-39.2019.5.12.0059. TRT da 12ª Região.
[3] Artigo 2º, inciso V, alínea “c”, da Lei 13.103/2015.
[4] Artigo 20 do Decreto-Lei nº 73/66 com suas alterações.
[5] Fls.07 da decisão em comento.
[6] Autor citado. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 19ª edição. Rio de janeiro. Editora Forense, 2001, páginas 1 e 2.
[7] Luiz Da Cunha Gonçalves. Tratado de Direito Civil. Vol. 1. Tomo I. Editora Max Limonad Ltda, 1995, página 534.